Genealogia

Ednardo Rodrigues Brasil

Durante muito tempo o termo utilizado para as mulheres com filhos que não estavam inseridas em um relacionamento conjugal era “mãe solteira”, posto que para a sociedade o casamento era um fator essencial para que as mulheres pudessem se tornar mães. O estado civil atrelado ao termo revela que a mulher casada goza de determinado status social não atribuído à mulher solteira, tampouco à mãe que não está inserida em um relacionamento conjugal.
Minha avó paterna, Maria das Chagas, sofreu todas as auguras de uma mãe solteira do início do século XX. Mulher negra e pobre, teve dois filhos, sem ter contraído matrimonio e com o agravante de os dois terem pais diferentes. Dessa forma, vovó enfrentou não só os preconceitos, mas terríveis dificuldades para suprir as necessidades básicas de seus meninos. Mantinha sua roça, lavava roupas “pra fora”, trabalhava em farinhadas, enfim, encarava todos os tipos de serviços que lhe fossem propostos.
A rigidez com que “Vó Cotinha” criou seus filhos fez com que estes se tornassem rapazes trabalhadores e honestos. Aos poucos, ocuparam posição de respeito dentro de sua comunidade, mostrando diferentes talentos.
Ambos os pais dos filhos de Maria eram casados, o que fez com que ela, durante muitos anos, escondesse seus nomes. Como era comum nas pequenas comunidades do interior, as pessoas lançavam suspeitas sobre quem eram os genitores dos filhos de Cotinha. Outros afirmavam ter certeza, sem no entanto poder provar, afinal só a mãe era detentora desse segredo.
Com o tempo passando e as desconfianças se tornando certezas, minha avó, que já envelhecia, finalmente revelou para algumas pessoas próximas o seu grande segredo. Mesmo pedindo sigilo, que logicamente não foi respeitado, em pouco tempo todos conheciam os nomes dos pais dos irmãos Francisco e José.
O nome do pai do meu pai, Francisco, há muito tempo não era mais segredo pra ninguém. Se tratava de Aciole, cidadão respeitado no lugar e que tinha outros muitos filhos com sua esposa Ermiliana. Inclusive, os filhos do casal já tratavam meu pai como irmão, ilegítimo, claro, há algum tempo. Além disso, eram muito amigos e sempre nutriram por meu pai grande carinho.
Já o caso do pai de meu tio José era mais complicado e, talvez por isso, minha avó tenha levado muito mais tempo para revelar seu nome. Vó Cotinha era muito amiga de Luisinha, mulher de França Rodrigues, depois revelado ser o pai de José. Outro entrave para a revelação, talvez o pior, era que França era também o pai de Socorro, minha mãe, casada com meu pai e nora de minha vó. Depois do exposto, tornou-se público que José era irmão de meu pai e de minha mãe e cunhada dos dois.
Para “embolar o meio de campo”, meu avô, pai de minha mãe, teve um longo relacionamento extraconjugal com uma irmã de meu pai, filha do “Vô Aciole”. Assim sendo meu pai acumulou as “funções” de genro e cunhado de Seu França. Dessa união de meu avô materno com minha tia, irmã de meu pai, nasceram dois filhos, um menino e uma menina. Estes eram irmãos de minha mãe, e sobrinhos e cunhados de meu pai.
Meus pais tiveram cinco filhos, ambos do sexo masculino, e todos nós sempre tivemos grande respeito e carinho pelos filhos do meu avô com minha tia. Éramos muito apegados a João, um deles, que frequentava diariamente a nossa casa. Um pouco mais velho que nós, o tratávamos como um irmão. Convenhamos que essa nossa estreita relação tem muita sustentação, afinal, o cara era irmão de minha mãe, cunhado e sobrinho do meu pai, nosso tio e nosso primo. Tava tudo em casa.

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