José Assef Fares nasceu no dia 12 de julho de 1923 na cidade de Fortaleza, capital do Estado do Ceará, sendo filho de Tufí Assef Abudai e de Júlia Assef Fares Abdala.
Antes de falarmos um pouco de sua vida, precisamos montar o contexto histórico da chegada de seu pai ao continente sul-americano.
O seu genitor chegou ao Brasil próximo ao fim da I Guerra Mundial, um conflito armado que aconteceu entre os anos de 1914 a 1918 e estava dividido em duas correntes de nações: a Tríplice Aliança e a Tríplice Entente.
Na época dessa guerra a sua pátria, o Líbano, que está localizada na Ásia Ocidental, estava no bloco ligado à Tríplice Aliança, pois era um protetorado do Império Otomano.
Com a vitória dos aliados o Império Otomano foi destruído e o Líbano passou aos cuidados da França, que nessa época atravessava sérias dificuldades para administrar politicamente um país que tinha enormes diferenças culturais e estava arrasado pela guerra.
Ainda nessa época, o Líbano sofria uma grave seca e os conflitos armados, por conta das diferenças religiosas entre cristãos e muçulmanos de confissão drussa, fizeram com que o Sr. Tufí Assef, cristão de confissão maronita, buscasse refúgio em um país que lhe desse conforto e dignidade para sobreviver:
“A população do Líbano é composta por diversos grupos étnicos e religiosos: muçulmanos [xiitas e sunitas], cristãos [maronitas, ortodoxos gregos, melquitas greco-católicos, cristãos armênios, cristãos assírios, coptas] e outras, incluindo as seitas alauita e drussa, e uma pequena comunidade judaica. No total o Estado reconhece a existência de dezoito comunidades religiosas, 59.7% dos libaneses são muçulmanos e 39% são cristãos.” (S.N.T)
Na cidade de Beirute, seguindo o exemplo de outros conterrâneos, entre eles alguns de seus irmãos, embarcou em um navio que vinha para o Brasil e assim chegou até o Estado do Pará, na região Norte do Brasil, aonde não quis ficar, permanecendo na embarcação que vinha para o porto do Mucuripe, que está localizado na cidade de Fortaleza, capital do Estado do Ceará.
Na cidade de Fortaleza, para sobreviver, passou a comercializar quinquilharias em uma banca na praça próximo aos Correios, no Centro, local de encontro da comunidade libanesa, e ali teve a oportunidade de conhecer a sua primeira esposa, também de origem libanesa, com quem gerou quatro filhos.
Alguns anos depois, o filho caçula dessa primeira união, José Assef Fares, depois de crescido, passou à acompanhar o seu pai nas lides do trabalho na feira, seguindo depois para cidade do Pará, onde trabalhou como “galego” para alguns dos seus tios.
Mais tarde, quando retornou para Fortaleza, conseguiu um emprego de contínuo na agência da Empresa de Correios.
Nesse emprego, aos poucos, o jovem foi conseguindo ganhar a confiança de seus superiores e de forma inteligente foi crescendo dentro de seu trabalho, passando a ser conhecido entre os seus colegas e pessoas da rua como “Zé Galego dos Correios”, devido a cor de seu cabelo e de sua pele.
Algum tempo depois, nessa feira, por coincidência do destino, avistou uma moça e logo se encantou por ela. Curioso em saber informações ao seu respeito descobriu que ela, Francisca Ione Martins Vieira, que havia nascida na cidade de Nova Russas no dia 15 de junho de 1919, era cunhada de um de seus colegas de trabalho, o Telegrafista Brício de Oliveira Cardoso.
Sem demora, começou a cercar-lhe e não demorou muito para que começassem a namorar até que, quis o destino que o pai da moça, o Sr. Venceslau Vieira Batista, a levasse para baixo de suas asas na cidade do Crato, localizada na região do Cariri, a 567 quilômetros da cidade de Fortaleza.
Em 1950, agora bem distante da capital, residindo em um dos bairros da cidade do Crato que é denominado de Cruz, sua consorte pensava que nunca mais iria ver o seu futuro esposo.
Nessa cidade, já envolvida com o novo ambiente, passou a trabalhar em uma máquina de costura que tinha sido previamente adquirida pelo seu pai no intuito de dar-lhe uma profissão rentável, ofício que foi ensinado por sua mãe, Dona Bernardina Martins Vieira.
Certo dia, sem imaginar, recebeu uma carta de seu pretendente marcando um encontro para conversar com o seu pai, que assustado decidiu ir imediatamente para Fortaleza no intuito de colher informações precisas sobre o suposto pretendente.
Chegando à capital, descobriu com o seu genro, o Telegrafista Brício de Oliveira Cardoso, das boas procedências do rapaz, fato que quebrantou-lhe o coração e fez-lhe permitir o namoro.
O romance passou algum tempo sendo feito através de cartas até que, no dia 26 de janeiro de 1951, ela com 32 e ele com 28 anos de idade, tiveram a celebração religiosa de seu matrimônio sendo realizada pela manhã, na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Penha, e logo depois, à tarde, no Cartório de Registro Civil, onde foram finalmente assinados os papéis cumprindo as obrigações perante o Estado.
Desse matrimônio foram gerados três filhos, um homem e duas mulheres, sendo eles: Fernando Antônio Vieira Assef, Maria das Graças Assef e Ana Célia Vieira Assef.
Logo após a celebração do matrimônio o novo e humilde casal organizou os seus poucos pertences e partiu de trem para capital, onde começaram uma nova vida juntos.
Chegando à cidade de Fortaleza, sem ter uma residência própria, passaram uma longa temporada residindo com o seu pai na Avenida Domingos Olímpio, Centro, que por conta do falecimento de sua primeira esposa já vivia com uma nova companheira e já tinha outros filhos dessa relação.
Nessa época, em seu emprego, as coisas passaram a se complicar, quando um novo diretor da Empresa de Correios passou a lhe perseguir e costumeiramente lhe humilhava por conta de seus trajes humildes.
Pacientemente e necessitando do emprego, resistiu a essa nova dificuldade e aos poucos conquistou a confiança do novo chefe até que, conforme nos informa o Diário Oficial da União do dia 9 de outubro de 1954, página nº 64, seção 1, nº 55, foi nomeado carteiro da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.
Pouco tempo depois, percebendo as dificuldades de convivência e relacionamento entre a sua esposa e a numerosa prole de seu pai, decidiu alugar uma casa na Rua Assunção, s/nº, Centro, onde residiu por oito anos e logo depois na Rua Floriano Peixoto, s/nº, ainda no Centro da cidade.
Nesse tempo a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, que estava passando por um reestruturação em seus quadros de serviço, tinha algumas cidades do interior do Estado do Ceará ainda descobertas por funcionários, sendo aos poucos contempladas com novos servidores e agências.
Curiosamente, por força do destino, recebeu transferência para uma cidadezinha do interior do Estado que, por coincidência, o seu sogro há pouco tempo tinha passado a residir e era o proprietário de uma farmácia.
Essa cidade, chamada de Boa Viagem, está localizada praticamente no centro do Estado do Ceará, em uma região denominada de Sertão de Canindé, onde o acesso e as condições de vida não eram das mais fáceis.
No início, alguns dias depois da notícia da sua transferência, relutou pela repentina e não planejada mudança de endereço, mas a sua esposa, felicíssima por poder morar próximo dos seus pais, tratou logo de organizar a mudança de seus poucos móveis e utensílios domésticos.
Logo que chegou ao Município de Boa Viagem, a cidade não oferecia boas condições de moradia e nem de sobrevivência, não havia iluminação pública e nem água encanada, praticamente tudo dependia daquilo que vinha de outros centros mais desenvolvidos, como o Município de Quixeramobim.
Inicialmente morou em uma casinha no Bairro de Nossa Srª de Fátima, depois em uma casa na Rua Agronomando Rangel e por fim passou a residir na Rua Antônio de Queiroz Marinho, nº 205, Centro.
Aos poucos o seu “Fares”, como ficou popularmente conhecido, foi se adaptando a sua nova cidade e com isso conquistando inúmeros amigos. Desde a sua chegada ao Município passou, nas horas de folga, a se divertir nos campinhos de futebol com a garotada. Quando faltava um goleiro, ou quando ninguém queria ir para o gol, logo se escalava na posição, era uma festa para meninada!
Nesse pacato convívio foi tomando gosto pela companhia da geração que surgia na cidade, tratando logo de organizar um time de futebol, o CRB – o Clube de Regatas de Boa Viagem, que tinha um campinho próximo ao velho matadouro público, aonde hoje é a Rua Alfredo Terceiro de Sousa, no Bairro Alto do Motor.
Todas às tardes, e especialmente aos finais de semana, era o local certo de encontrá-lo na companhia da meninada, e entre eles o seu filho, Fernando Antônio Vieira Assef.
Nessa época outro sonho a se realizar era ver uma seleção do Município de Boa Viagem disputando o Torneio Intermunicipal organizado pela APCDEC – a Associação Profissional dos Cronistas Desportivos do Estado do Ceará.
Diante disso, juntamente com outros amigos, passou a solicitar do Poder Executivo a construção de um local adequado para receber a disputa dos jogos da competição, visto que os campos de futebol que eram utilizados na época, o do Jatobá e o da Floresta, não atendiam as especificações exigidas pelo comitê organizador.
Nesse mesmo tempo, os ares do progresso já começavam a soprar sobre o Município de Boa Viagem, quando por iniciativa do Governo Federal foram iniciadas às obras de pavimentação da Rodovia Federal Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, a BR-020.
Com a pavimentação dessa rodovia, parte dos planos em ter um campo apropriado para disputa dos jogos do intermunicipal começaram a se tornar realidade, pois às máquinas de terraplanagem agora eram fáceis de serem alugadas pela Prefeitura de Boa Viagem.
A pedido dos desportistas da cidade, entre eles o seu “Fares”, o Governo Municipal, na época da primeira gestão do Prefeito Benjamim Alves da Silva, adquiriu e organizou um campo de futebol, que foi cuidadosamente cercado com arame liso em estacas de madeira, sob a cuidadosa coordenação do seu “Fares” e do Sr. Francisco Braga do Nascimento, outro declarado amante do esporte.
Nessa época a praça de esportes da cidade de Boa Viagem, que depois de algum tempo foi murado, passou a ser conhecida entre os desportistas como Estádio Municipal Beija-Flor, homenagem a um dos pássaros que rotineiramente víamos no local.
Também nesse tempo, a seleção passou a disputar os jogos da competição intermunicipal e o seu “Fares” fazia o papel de coringa do time: era o técnico, o preparador físico, o gandula, o roupeiro e às vezes até o psicólogo dos jogadores.
Nessa época, em 1983, na XVI edição do torneio, logo após a realização de uma brilhante campanha, a Seleção do Município de Boa Viagem conseguiu a façanha de chegar a grande final, que foi disputada no Estádio Plácido Aderaldo Castelo, o Castelão, onde foi derrotada pelo placar mínimo, ficando com o vice-campeonato:
“A história do Boa Viagem Esporte Clube tem início na década de 1980. Naquela época a Seleção do Município foi inscrita em uma competição Intermunicipal realizada pela Associação Profissional dos Cronistas Desportistas do Estado do Ceará, a APCDEC. Em 1983 o clube, que ainda não era profissional, chegou à final da competição, todavia não conseguiu conquistá-la, foi derrotado na final pela equipe de Itapipoca pelo placar de 1 a 0. Quatorze anos depois, em 1997, o sonhado título tornou-se realidade, o Boa Viagem venceu a equipe de Maranguape na final da competição e tornou a repetir a façanha em 1998, quando conseguiu derrotar na final o selecionado de Aracati. Com a conquista do Torneio Intermunicipal o Boa Viagem Esporte Clube garantiu o direito de disputar a Segunda Divisão do Campeonato Cearense de 2000. Diante disso, a sociedade do Município de Boa Viagem se organizou em torno do clube e, com apoio da Governo Municipal, foi fundado o Boa Viagem Esporte Clube.” (S.N.T)
Nessa época, além de ver o seu sonho concretizado, que era a organização da Seleção do Município, o seu “Fares” tinha a satisfação de ver também o seu filho no elenco do time, algo que lhe dava um imenso orgulho.
Depois de aposentado, com toda a família já bem encaminhada, ainda preocupado com a formação das novas gerações do Município, se ofereceu como voluntário ao juiz da cidade para servir como Comissário de Menores do Poder Judiciário.
No fim da década de 1980, outra satisfação que lhe encheu de orgulho foi ver o seu filho, depois de concluir o curso de Direito, projetar-se como personagem da política municipal sendo eleito a uma das cadeiras do Poder Legislativo e dentro de pouco tempo, nos primeiros anos de 2000, chegar à chefia do Poder Executivo.
Antes disso, no dia 5 de março de 1990, através de uma resolução encaminhada pelo Vereador Edson Alves da Silva, foi agraciado com o titulo de cidadania concedido pela Câmara Municipal de Vereadores.
Considerado por muitos como uma das figuras folclóricas da cidade de Boa Viagem, logo que se aposentou, costumava passar horas na Praça Antônio de Queiroz Marinho, acompanhado de outros negociantes e ouvindo um rádio, fazendo trocas e quando sentia que o negócio era vantajoso costumava exclamar: “é uma fortuna!”, causando riso aos que passavam.
Alguns anos depois, no dia 14 de julho de 2001, depois de completar 78 anos de idade, padecendo de pneumonia por ser fumante ativo, faleceu na cidade de Fortaleza no Hospital da UNIMED.
Logo após o seu falecimento, foi trazido da capital e depois das despedidas fúnebres que são de costume foi sepultado no mausoléu da família existente no Cemitério Parque da Esperança, que está localizado na Rua Maria de Nazaré Bezerra, s/nº, no Bairro de Nossa Srª de Fátima.
BIBLIOGRAFIA:
- FRANKLIN, Ruben Maciel. “Galegos”: Uma história da imigração libanesa no Ceará (1890-1930). Belo Horizonte: Letramento, 2020.
- NASCIMENTO, Cícero Pinto do. Memórias de Minha Terra. Fortaleza: Encaixe, 2002.
- SILVA JÚNIOR, Eliel Rafael da. Venceslau Vieira Batista. Disponível em https://www.historiadeboaviagem.com.br/venceslau-vieira-batista/. Acesso no dia 13 de junho de 2018.
- SILVA JÚNIOR, Eliel Rafael da. Francisca Ione Vieira Fares. Disponível em https://www.historiadeboaviagem.com.br/francisca-ione-vieira-assef/. Acesso em 3 de julho de 2018.
HOMENAGENS PÓSTUMAS:
- Em sua memória, na gestão do Prefeito Dr. Fernando Antônio Vieira Assef, através da lei nº 818, de 12 de dezembro de 2002, uma das ruas que se estendem pelos Bairros Padre Paulo e Várzea do Canto, na cidade de Boa Viagem, recebeu a sua nomenclatura;
- Em sua memória, ainda na gestão do Prefeito Dr. Fernando Antônio Vieira Assef, através da lei nº 825, de 4 de abril de 2003, uma escola da rede municipal recebeu a sua nomenclatura;
- Em sua memória, nos primeiros meses de 2005, o seu nome foi lembrado ainda pela equipe de jornalismo esportivo da Rádio Asa Branca, AM 710, conhecida no Município como Equipe Esportiva José Assef Fares, graças a sua desmedida paixão pelo futebol;
- Em sua memória, em 2011, novamente na gestão do Prefeito Dr. Fernando Antônio Vieira Assef, orientado pelo Ministério Público através do promotor da comarca, Dr. Marcus Vinícius Amorim de Oliveira, por força da lei nº 6.454, de 24 de outubro de 1977, que trata sobre a proibição da utilização do nome de pessoas vivas em edifícios públicos, bem como no que está escrito na Lei Orgânica do Município, o Núcleo de Arte, Educação e Cultura Dr. Fernando Antônio Vieira Assef, regulamentado na administração do Prefeito Dr. Fernando Antônio Vieira Assef através da lei nº 891, de 23 de dezembro de 2004, teve a sua nomenclatura revogada e alterada através da lei nº 1.085, de 4 de março de 2011, para Núcleo de Artes e Cultura José Assef Fares;
- Em sua memória, em 2012, ainda na gestão do Prefeito Dr. Fernando Antônio Vieira Assef, através da lei nº 1.206, de 13 de agosto de 2014, o Centro de Esportes recebeu a sua denominação.
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